MARIA FERNANDA SALVADORI PEREIRA

CRP 912612

MARIA FERNANDA SALVADORI PEREIRA

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Comportamentos autolesivos

→ Antes de ler, saiba que para alguns esse pode ser um assunto perturbador. Sugiro considerar seus interesses.

“Mas por que colocar um assunto assim tão pesado!?” Primeiro porque pesquisando e atendendo adolescentes fiquei surpresa de como era um sintoma recorrente. Muito!  Depois, pesquisando e olhando de forma mais macro, vi que a estimativa da ocorrência desse comportamento entre jovens que vivem países industrializados varia entre 9% à 22%Com uma tendência de crescimento importante: triplicou em vinte e cinco anos [1]

A seguir, um panorama dos tópicos que serão abordados no texto:

O que é um comportamento autolesivo?
Por que as pessoas se autolesionam?
Por que vem aumentando?
O que fazer caso seja você quem esteja passando por isso?
O que fazer para ajudar alguém que esteja passando por isso?

Um comportamento autolesivo ocorre quando é a pessoa deliberadamente provoca um dano ao seu corpo ou à sua imagem. A forma mais comum é se cortar nos braços e nas pernas, mas ou também pode ser provocando queimaduras, se arranhando, batendo a cabeça (ou contra a cabeça), cutucando feridas (para não cicatrizarem ou para piorarem), se expondo depreciativamente ou ingerindo doses não letais de medicamentos comumente disponíveis em casa. Esses comportamentos, na maior parte dos casos não tem uma finalidade suicida e nem uma finalidade em si mesmos. São uma maneira de lidar com dores emocionais ou estados de tensão extremamente opressivos. Após os cortes (vou usar os cortes como exemplo) a atenção se voltaria para a experiência de dor, que supostamente atenuaria a dor emocional. [2]

Embora os cortes sirvam para aliviar a tensão emocional, essa é uma solução temporária e com enorme potencial aditivo. Pois a partir daí se inicia um círculo vicioso onde o que vem a seguir são sentimentos de vergonha e culpa [3]. Daí, tenta-se cobrir e disfarçar as feridas e cicatrizes (usando mangas compridas, maquiagem). Vem também a sensação de estranheza e inadequação pessoal, que favorece o isolamento. Todos estes sentimentos e comportamentos deixam a pessoa suscetível a uma nova crise.

Muita gente tem se perguntado o porquê desse comportamento ter aumentado. Entre as principais respostas, estão desde as condições de socialização presentes na sociedade contemporânea, que favorecem a tensão solitária; até uma difusão dessa prática nas redes sociais. [4] 

Se você está enfrentando esse problema, reconheço que essa tem sido uma saída que você encontrou. Entendo que o sentimento (ou a falta dele – o vazio…)  seja muito pior do que qualquer dor física e que você precisava fazer algo a respeito, mesmo para evitar algo pior. Mas também sei que tem um lado seu que só quer ficar bem. Por isso saiba que procurar ajuda para falar sobre seus sentimentos não é fraqueza – é um sinal de força e coragem. Pois mostra  que você está lutando para ganhar controle sobre essa situação. Então sugiro que procure alguém que você confie (pode ser um amigo, um funcionário da escola, um familiar…). Alguém com quem você se sinta confortável e não esteja com o mesmo problema. Isso vai te ajudar a pular fora disso e ainda ajudará outros a fazerem o mesmo.    

Se você é um familiar ou alguém que pretende ajudar a pessoa, tenha em mente que esse comportamento não é um jeito de chamar a atenção, como se diz. Mesmo porque a maioria dos jovens que age assim, não conta a ninguém. Este é um sintoma de intenso sofrimento e um modo inadequado de regular as emoções que pode ser superado. Não se precipite em rotular de antemão os motivos e encare como uma oportunidade de apoio e orientação. Se você conhece alguém que está passando por esse tipo de problema, ajude para que ele tenha acesso a um tratamento adequado.Ridicularizar, ameaçar ou mesmo agredir esse jovem, obviamente só vai piorar a situação. Já incentivar isso… É crime, e que tem um agravante, caso cometido por intermédio da internet.

    Fontes:

1. GILLIES, Donna, et al. Prevalence  and  Characteristics  of  Self-Harm  in  Adolescents:  Meta-Analyses  of  Community-Based Studies 1990-2015. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2018; v. 5, n 10, p. 733-41

2. FONSECA, P. H. N. et al . Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arq. bras. psicol.,  Rio de Janeiro ,  v. 70, n. 3, p. 246-258,   2018

3. GUNNARSSON, Nina. V. The Self-perpetuating Cycle of Shame and Self-injury. Humanity & Society, 2021; n.45, v.3,p. 313-333.

4. LE BRETON, David. O Risco Deliberado: sobre o sofrimento dos adolescentes. Revista de Ciências Sociais, n. 37, Outubro de 2012 – p. 33-44 WHITLOCK Janis, Purington Amanda, Gershkovich Marina: Media, the internet, and nonsuicidal selfinjury. Washington, DC: American Psychological Association; 2009, p.139–155.

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